As dificuldades para empreender no Brasil

As vantagens e dificuldades das Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) foram abordadas pelo presidente da Tradener, Walfrido Avila, em palestra realizada para os membros da Academia Nacional de Engenharia (ANE), durante a reunião geral de julho. Em sua apresentação, Walfrido Avila traçou um panorama do setor e respondeu a perguntas da diretoria.

Em sua análise do mercado, o especialista mostrou que há demanda de energia em todo o país, falou sobre os projetos de PCHs, de energia eólica e solar, das dificuldades para implantação desses projetos e criticou o excesso de licenciamento ambiental existente no Brasil, que na sua visão atrasa o desenvolvimento do país.

Engenheiro Civil formado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), Walfrido Avila trabalhou na Copel por 28 anos nas áreas de planejamento e construção de geração. Atuou também no projeto Reforma do Setor Elétrico Brasileiro (Reseb) como coordenador da delegação da Copel, representando o Estado do Paraná.

 

Presidente da Tradener, Walfrido Avila, critica excesso de licenças ambientais existentes no Brasil

O sr. disse que há um potencial de 13 gigawatts de inventários disponíveis. Há viabilidade econômica para esses potenciais que não têm a correta valoração de seus atributos hídricos devidamente feitas frente às outras usinas renováveis, como a eólica e a solar, que apresentam desequilíbrio em termos de subsídios e impostos. Quais seriam suas propostas para viabilização desses conjuntos?

Walfrido Avila – Uma forma seria retirarmos os impostos durante a construção, imediatamente essas usinas poderiam ser direcionadas, por exemplo, para o Mercado Livre. Elas ficarão mais baratas que solares e eólicas. O valor ficará competitivo.

Ao falar sobre sistema de transmissão, o sr. não levou em conta, por exemplo o sistema de transmissão associado que no caso das PCHs, por estarem, em sua maioria, muito mais próximas dos centros de carga, admitem uma transmissão até em média tensão, enquanto as eólicas, mais próximas do litoral do nordeste, estão exigindo um reforço significativo que está nos planos decenais da rede de alta tensão.

Walfrido Avila – Algumas PCHs terão dificuldades, mas não justifica fazer um linhão nacional de PCH, seria irracional. Temos o nosso sistema brasileiro já bastante distribuído e ligar também as PCHs nas distribuidoras na maioria das vezes é muito simples. Agora, por que esse investimento não pode ser também da distribuidora, já que de qualquer forma ela vai fornecer a energia para a construção, e depois a linha é quase a mesma?  Por que não deixar remunerar isso na distribuição?  É questão de fazer conta.  Há um espaço para conversar e planejar isso, acredito que a dificuldade ambiental é mais difícil de equacionar.

Recentemente saiu na mídia uma comparação entre energia solar e hidráulica, levando em consideração o sistema de transmissão onde mostra que a energia solar é no Brasil, em média, mais cara que as PCHs se o valor da transmissão for incluído no custo da usina. A questão é que no caso da PCH, o proprietário terá que fazer a sua linha enquanto nas eólicas e solares contam com um sistema nacional que vai até lá coletar a energia produzida por esses parques. Qual sua análise sobre esse aspecto?

Walfrido Avila – A diferença maior é que nesse caso das energias eólica e solar a TUSD será paga depois de prontos as usinas, e no caso das PCHs é preciso fazer todo um investimento antes. É enorme a diferença de trato entre uma fonte e outra, quando devia ser tudo igual para permitir comparações. Hoje, quando se faz um leilão de eólica ou solar, vemos que essas fontes são mais baratas. Já na Europa o preço da solar e da eólica é bem menos do que aqui. Precisamos entender um pouco mais o sistema mundial, saber como se fazem as coisas por lá para tentar mudar o nosso jeito. Na Alemanha, por exemplo, a PCH tem apenas uma licença ambiental, cuja emissão é prioritária. Visitei Munique e lá eles protegem as PCHs, que são uma fonte de energia mais barata e também fonte de riqueza para o país. Como lá eles conseguem valorizar as PCHs como fonte de energia?

O que o sr. recomendaria para mitigar a burocracia do licenciamento ambiental sem perder a qualidade desse processo que o sr. preserva muito. O que o sr.  acha que poderia ser feito?

Walfrido Avila – No Brasil temos uma quantidade enorme de licenças, como mostrei na apresentação que fiz em uma reunião geral da Academia, enquanto na Alemanha, por exemplo, há apenas uma. Quando fizemos a Usina de Foz do Areia, no Paraná, na década de 1980, não existia nenhuma licença. Foram 1.280 megawatts instalados e zero licenças. Relocamos todos e tudo o que estava na área – até cemitério! Não morreu nenhum animal. Não havia esse excesso de licenças que temos hoje. Agora se formos cortar uma árvore é preciso alguém para fiscalizar, para ver se estamos cortando e se ele não estiver presente no local, tenho que esperar ele chegar. Temos que rever essa política, essa é a verdade. Temos que chegar ao modelo da Alemanha, não com uma licença, mas duas talvez, 100% a mais do que a Alemanha. Essa é uma questão difícil de discutir, mas sei que é possível. Itaipu é um exemplo de cuidado com o meio ambiente e não precisou de todas essas licenças. Sei que estamos em outro momento da sociedade, mas é difícil entender o porquê de o Brasil ter implantado isso e colocado tanto imposto sobre as usinas. Invisto em todos os tipos de energia, mas não consigo entender isso.

Como o sr. está conseguindo comercializar energia solar e eólica num mesmo sítio como usina híbrida para dar maior aproveitamento ao seu sistema de transmissão aproveitando a diversidade do local?

Walfrido Avila – Isso não é problema porque estou limitado a uma potência de pico da linha, na verdade, eu comercializo megawatt-hora. Não comercializo energia eólica, não comercializo energia hidráulica e sim quilowatt-hora. Em nossos projetos de eólica, por exemplo, se pudermos agregar geração de energia solar, porque há horas que não venta, há um aproveitamento maior. Do contrário, o próprio parque fica limitado, por exemplo na exportação que existe hoje. Imagine que eu tenha uma subestação que permite no máximo 90MW. Então, quando está gerando zero de eólica, e tem sol, gera energia solar já que o parque pode gerar 90MW. Tudo controlado pelo mesmo equipamento. Isso é possível graças ao desenvolvimento da engenharia e em muitos lugares é possível fazer isso. Eu não vejo problema.

Mas quando a usina tem a capacidade de gerar mais do que está previsto no contrato de transmissão e ocorre a ultrapassagem do previsto neste contrato?

Walfrido Avila – Isso terá que ser resolvido caso a caso, não dá para colocar uma norma geral. Digo ainda que se isso ocorrer, pela segurança, a tarifa de ultrapassagem será maior que o valor da energia, mas são situações específicas.

Como o sr. planeja o seu fluxo de caixa em função da energia ser produzida ao longo de muitos anos e estar a mercê das mudanças climáticas. Como é feito esse cálculo?

Walfrido Avila – Fazemos isso para tudo. Compramos uma PCH pequena de uma multinacional que estava há cinco anos dando prejuízo. Nestes cinco anos conosco, ela deu lucro e pagou o que ainda faltava quitar do financiamento. A questão é planejar. A hidrologia não é cartesiana e para fazer o cálculo é preciso entender muito não só do sistema hidroelétrico, mas do sistema nacional, de MRE etc. Outro aspecto a ser considerado é que existem as regras e o problema é quando não são seguidas, aí temos que operar em um nível de risco muito maior.